Geodiversidade e exploração dos recursos minerais

Monumento Natural das Pegadas de Dinossáurios 
da Serra de Aire

A geodiversidade encontra-se constantemente ameaçada, sendo maioritariamente proveniente da direta ou indireta ação antrópica. Este aspeto não difere muito no que se refere às ameaças para a geodiversidade ou para a biodiversidade. A geodiversidade encontra-se ameaçada de diversas formas desde a degradação da paisagem natural à destruição de um pequeno afloramento. As atividades de exploração dos recursos minerais conduzem, inevitavelmente, a uma destruição de parte importante da geodiversidade (Brilha, 2005). A necessidade de aquisição dos mais variados materiais geológicos para posteriormente serem utilizados pelo Homem a nível do desenvolvimento e conforto de que as sociedades industrializadas usufruem constituem um enorme impacto na geodiversidade. A exploração dos recursos minerais não metálicos (pedreiras, saibreiras, areeiros, barreiros) constitui, portanto, uma ameaça à geodiversidade ao nível da paisagem e ao nível do afloramento com a destruição de objectos geológicos, como fósseis ou minerais, de valor científico, pedagógico ou outro. Contudo a atividade extractiva é um método direto do estudo da Terra pois pode servir para abrir “janelas” para o interior da crusta terrestre (Brilha, 2005) (Cachão e Silva, 2004).
Um bom exemplo é o Monumento Natural das Pegadas dos Dinossáurios da Serra de Aire que se situa na antiga pedreira, a Pedreira do Galinha (fig.1).

Fig.1 - Monumento Natural das Pegadas dos Dinossáurios da Serra de Aire que se situa
 numa antiga pedreira.
Num final de tarde primaveril de 1994, João Carvalho, da Sociedade Torrejana de Espeleologia e Arqueologia, descobriu, por um feliz acaso, um dos maiores achados do século XX, em Portugal – vários trilhos de pegadas de saurópodes (fig.2), de diferentes corpulências, com mais de 175 milhões de anos, pegadas que viriam a transformar a pedreira no monumento actual. Se não fossem uns jovens, interessados em espeleologia, à procura de fósseis na Serra D’Aire ainda hoje Rui Galinha estaria a explorar a pedreira, de 20 hectares, situada dentro de um parque natural, que herdou do seu pai (Cabeleira, 2006).
Fig. 2 - Pegadas de saurópodes.
O Museu Nacional de História Natural criou um grupo de trabalho, que realizou a avaliação científica, pedagógica e cultural deste icnótopo, para demonstrar às entidades oficiais e científicas, a importância paleontológica do achado (os 20 trilhos existentes, com mais de 1000 pegadas de saurópodes, são os maiores e os mais antigos trilhos de que há conhecimento, mas também, dos mais bem conservados) e consequente criação do monumento visto ser um local onde ocorrem evidências da geodiversidade – geossítio – com especial interesse, valor científico e excepcionais características didácticas e, como tal, deve ser conservado de modo a garantir que as futuras gerações de cientistas possam continuar a investigar, usando técnicas e métodos cada vez mais sofisticados.
Da descoberta acidental até à ao fecho da pedreira e classificação como monumento natural (Decreto Regulamentar 12/96 de 22 de Outubro) decorreram dois anos de durissímas e atribuladas negociações com o Estado (Cabeleira, 2006). 

Fig.3 - Jardim Jurássico.
Fig.4 - Aramossaurio - o cartão de visita do parque.
O monumento abriu ao público em março de 1997 e no mesmo ano é fundado o primeiro circuito autónomo de visita e de interpretação da jazida. Em 2002, é criado o Jardim Jurássico (fig.3) que mostra aos visitantes plantas atuais (fósseis vivos) de grupos botânicos caraterísticos no Mesozóico (fetos arbóreos e não arbóreos, cicas, araucárias, ginkos, zimbros, teixos e cavalinhas) e o Aramossáurio (fig.4). O parque possui ainda uma área de animação, um Centro de Animação Ambiental, um parque de merendas, um grande painel ilustrativo da evolução da vida na Terra ao longo do tempo geológico e diversos painéis informativos ao longo dos cerca de 1000 metros do seu percurso.



Onde se extraía brita para a construção civil está hoje instalado o Monumento Natural das Pegadas de Dinossáurios da Serra D’Aire e Candeeiros visitado anualmente por mais de 50 mil pessoas, uma obra que só existe porque lá antes existiu uma pedreira. 
Este caso foi um exemplo feliz visto que as acções de protecção de jazidas paleontológicas, no nosso País, possuem ainda caráter de excepção pois não fazem parte de um plano global e sistemático de definição, proteção e conservação do Património Paleontológico Português (Cachão e Silva, 2004).

Bibliografia:
Brilha, J. (2005). Património geológico e geoconservação: a conservação da natureza na sua vertente geológica, Palimage Editores. Viseu.

Cachão, M. e Silva, C. (2004). Introdução ao Património Paleontológico Português:
definições e critérios de classificação. Geonovas - Associação Portuguesa de Geólogos. 18: 13 – 19. Acedido em 29 de novembrode 2017, em: http://paleoviva.fc.ul.pt/cmsbibliogafia/cms061.pdf

Cabeleira, M. (2006, 23 de agosto). As pegadas que acabaram com a pedreira do Galinha. O Mirante, p.1. Acedido em 29 de novembrode 2017, em:


Monumento Natural das Pegadas de Dinossáurios da Serra de Aire. (2002). Conheça o Monumento. Acedido em 28 de novembro, em:    http://www.pegadasdedinossaurios.org/html/home.htm


Fotos: 

1 comentários:

João Alves disse...

Ana Conceição, li com atenção as suas três reflexões sobre as ameaças à geodiversidade e geoconservação. Escolhi comentar esta sobre o monumento natural das pegadas de dinossáurios da Serra de Aire por dois motivos: o primeiro porque, devido a este tema, me obriguei a visitar a Serra dos Candeeiros para visitar vários aspectos do parque e porque fiquei curioso sobre os prismas basálticos sobre os quais li no livro de José Brilha. Ainda não deu para ir visitar as pegadas. A Segundo é devido à minha vida profissional. A minha acção, e da Câmara Municipal onde trabalho, depende muito do material retirado das pedreiras. Muitas vezes por necessidade imperiosa para melhorar as condições de vida das populações, mas muitas vezes para satisfazer a vontade dos políticos de apresentar obra sem que se vislumbre grande necessidade das mesmas. Como conciliar a protecção e conservação da geodiversidade com a necessidade que temos de a delapidar, é um grande desafio. Para o vencer é necessário eliminar muito da iliteracia cultural, não só da população em geral, mas também dos técnicos envolvidos (Brilha, 2005). Como diz Bilha, as frentes de exploração podem ser usadas, não só para a descoberta de valores como as pegadas de dinossáurios (um receio imenso para os proprietários das pedreiras), mas também para o estudo e observação científica da geodiversidade (Bennett et al., 1997) (Brilha 2005). Também poder-se-ia tirar partido dessas frentes, quiçá como obrigação dos industriais, para visitas de estudo e geoturismo dedicado (Brilha, 2005) com acompanhamento de especialistas. A sua recuperação poderá também trazer benefícios de vária ordem, como o museu do quartzo promovido pela Câmara de Viseu (Brilha, 2005). Já a transformação do espaço para outros fins como foi o caso da construção do estádio municipal de Braga, pode suscitar algumas dúvidas sobre a geoconservação daquele sítio.
Cumprimentos,
João Alves

Enviar um comentário